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13 de mai. de 2019

Humanizar parto é melhor opção para reduzir violência, dizem especialistas

A violência obstétrica começou ainda na recepção, com as recepcionistas me atendendo mal. As enfermeiras diziam que quanto mais eu gritasse mais ia demorar para o médico me atender. Elas me mandavam calar a boca e ficavam fazendo piadas. Na hora do parto eu falei para o médico que estava sentindo muito dor e ele ignorava cantando uma música bem alta. Outra médica veio ajudar e ficou empurrando minha barriga enquanto ele puxava o bebê por baixo. Foi uma dor horrível”. Esse é apenas um pequeno relato do que a auxiliar de farmácia Ágata Costa Pereira (25) passou durante seu primeiro parto.
Ela tinha apenas 15 anos e, por não saber sobre os procedimentos do parto, considerou que todas aquelas medidas eram corretas, porém dolorosa e traumática. Sete anos depois, na sua segunda gestação, Ágata buscou informações e, após um parto sofrido, optou pela cesárea. "Eu estava certa que ia fazer cesariana, não queria passar por tudo aquilo de novo. Meu corpo sofreu muito e demorei quase três meses para me recuperar do parto, do corte da episiotomia [corte no períneo no período expulsivo do parto], que ainda hoje eu tenho cicatriz. Um procedimento que não foi bem explicado. Mas depois de conhecer uma doula, o trabalho que ela desenvolvia e sobre o parto humanizado eu decidi que queria ter meu segundo filho o mais natural".
Ágata Costa Pereira, com o segundo filho: parto natural, mais humanizado e confiança recuperada. Foto: Reprodução/Arquivo Pessoal 
Ágata deu à luz ao seu segundo filho na Maternidade Dona Evangelina Rosa. O parto aconteceu no banheiro, enquanto ela relaxava de mais uma contração. Durante o trabalho de parto, todo o processo foi respeitado, desde as contrações, decisão do local que queria ter o bebê, além de receber massagem e orientações para relaxamento."Só hoje eu entendo que o que passei no meu primeiro parto foi violência obstétrica, porque o parto não precisa ser traumático e doloroso como foi. Meus direitos não foram respeitados, eu fui humilhada, não podia nem caminhar pelos corredores, para aliviar as contrações, que as enfermeiras gritavam comigo, dizendo que eu tinha que ficar no quarto e que iam me amarrar na cama".
 Para Ágata, a busca pela informação é a melhor maneira de evitar que este tipo de situação aconteça. Segundo ela, foi através da popularização do termo e das discussões que acompanhava na imprensa e em grupos que descobriu os abusos sofridos quando era jovem. "As pessoas precisam pesquisar, conhecer como as coisas devem ser para, assim, poder agir", conta.
A agressão pode acontecer durante ou depois da gestação
A violência obstétrica é aquela que acontece no momento da gestação, parto, nascimento e/ou pós-parto, deste o atendimento ao abortamento, podendo ser física, psicológica, verbal, simbólica e/ou sexual, além de estar relacionada com a negligência, discriminação e/ou condutas excessivas ou desnecessárias ou desaconselhadas. Essas práticas, normas e rotinas rígidas que as mulheres são submetidas, muitas vezes desnecessárias, remetem ao desrespeito da mulher, ao seu corpo, ritmo natural e, principalmente do seu protagonismo.
A doula e advogada especialista na Defesa dos Direitos das Mulheres, Helflida Sousa Rocha, explica que a violência obstétrica está relacionada à humilhação, ao destrato e desrespeito à mulher, tanto relacionado ao parto como à mulher, sobretudo quando é retirada a autonomia da gestação da mulher, impedindo que ela participe das decisões, do que vai acontecer e da realização de procedimentos sem necessidade.
“Essa violência pode ser física, como forçar um procedimento, fazer vários exames de toque sem necessidade, fazer a episiotomia, que é o corte do períneo para o bebê sair mais rápido, fazer parto cesariano sem indicação da necessidade. Também pode ser psicológica, como frases agressivas como “não doeu quando fez sexo”, ou chamar a mulher de fraca. Institucional, como não ter atendimento ao chegar ao hospital, não fazer um pré-natal digno. Ou seja, a violência obstétrica é uma violência que pode ser cometida por todos que estão em volta daquela mulher, desde o recepcionista que a atende para fazer a ficha, ao maqueiro, à enfermeira, técnico até o médico. Inclusive pela doula, se esta não respeitar os desejos da mulher”, destaca.
Ministério considera termo ‘violência obstétrica’ inadequado
Após anúncio do Ministério da Saúde orientando que o termo “violência obstétrica” fosse evitado, ou até abolido, em documentos de políticas públicas, gerou uma discussão acerca do tema, dividindo opiniões entre entidades médicas, profissionais da saúde, doulas, pacientes, movimentos sociais e instituições envolvidas no combate à violência contra a mulher. Segundo o depacho, “o termo ‘violência obstétrica’ tem conotação inadequada, não agrega valor e prejudica a busca do cuidado humanizado no continuum gestação-parto- puerpério”.

Foto: Reprodução
A advogada Helflida Sousa Rocha comenta que o termo violência obstétrica ainda é muito indiscriminado pela classe médica, sobretudo porque os médicos associam a expressão como sendo um ataque direto à categoria, em especial ao médico obstétrico, sendo que tem enfermeiro obstétrico e outros profissionais que estão envolvidos durante o parto. A advogada pontua que, durante alguns anos, a classe médica tem lutado para que esse termo seja abolido. “Eles se sentem ofendidos, mas infelizmente essa violência acontece. Esse termo é internacionalmente reconhecido. A violência obstétrica é tratada como uma afronta aos Princípios da Dignidade da Pessoa Humana e da Autonomia. Extinguir o termo é um retrocesso, pois essa discussão vai perder força e será preciso trabalhar tudo de novo. Esse termo deveria ser extinto se a violência realmente deixasse de existir”, salienta.
A advogada acrescenta ainda que muitas mulheres que sofrem violência obstétrica não sabem reconhecer este ato, por isso a necessidade deste tema e termo continuarem sendo debatidos. “Se for extinto, vai ser ainda mais complicado fazer essas mulheres entenderem o que estão passando. Elas vão achar que é normal aquele tipo de procedimento, como empurrar a barriga, que é algo proibido. O que essas mulheres sabem é que tiveram um parto muito sofrido e traumático e que não querem mais um parto normal. Por isso é preciso fortalecer o que vem a ser a violência obstétrica, para que elas reconheçam e tomam atitude”, afirma.
De acordo com Helflida Sousa Rocha, existem estudos que já mostram que o modo como o parto é feito pode ser equiparado a abuso sexual. Isso porque o parto envolve toda a região íntima da mulher e, por estar dependente dos profissionais da sala de parto, estão vulneráveis e suscetíveis a eles. “Se o profissional coloca os dedos dentro da vagina dela, toca mais do que o necessário, se faz piadas ou críticas a essa mulher durante o parto, ela fica com medo de represália e do tratamento ser ainda mais complexo. Com isso, essa mulher pode desenvolver sintomas semelhantes ao de abuso", ressalta.
Por: Isabela Lopes

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