Se constituísse a população de uma cidade, a massa de detidos pela polícia por causa dos entorpecentes teria mais habitantes do que 41 dos 92 municípios do estado. É como se, em apenas 16 meses, um pouco mais do que todos os moradores de Arraial do Cabo, na Região dos Lagos, fossem retirados das ruas e encaminhados à delegacia.
— A legislação atual só serve para gerar encarceramento massivo, é uma estupidez. Estudo o assunto há quase 30 anos e digo que a guerra às drogas nunca adiantou nada. A repressão gera apenas mais violência — afirma a antropóloga Alba Zaluar, especialista em segurança pública e coordenadora do Núcleo de Pesquisa das Violências (Nupevi), vinculado à Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).
Entre os quase 30 mil capturados, pouco mais de um quarto (8.338) é menor de 18 anos, apreendido por crime análogo ao de tráfico — veja no infográfico abaixo. Se somados a esses adolescentes os presos que têm até 21 anos, chega-se a um percentual superior a 60% de suspeitos que se envolvem com as drogas ainda muito jovens.
Os números do ISP apontam também que três a cada quatro presos por tráfico no estado são negros (30,1%) ou pardos (46,1%). Já os brancos, que correspondem a 22,5% dos detidos por tráfico, compõem 27,7% dos 392 autuados por portar entorpecentes para consumo próprio, superando, neste tipo de delito, a parcela de negros, que é de 25,8%. Os homens respondem por mais de 91% das prisões por tráfico.
— Se não fossem negros e pobres, seriam considerados usuários. A lei analisa condições sociais e de moradia e dá brecha para que o juiz a aplique de maneira seletiva — critica a socióloga Julita Lemgruber, do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes.
Mais de 40% disseram estar desempregados
Depois de encaminhados à delegacia, mais de 40% dos detidos por tráfico, ao ser feito o registro de ocorrência, relataram estar desempregados. Desconsiderando os que estavam fora do mercado de trabalho, a ocupação mais frequente relatada à polícia reflete a baixa média de idade dos suspeitos: é a de estudante, presente em 12,3% dos casos.
A lista de profissões predominantes entre os presos ou apreendidos por ligação com drogas também tem como característica comum a informalidade. No rol de suspeitos, há pedreiros, pintores, biscateiros...
— Isso é reflexo da crise econômica. Além disso, mesmo que não seja condenada, a pessoa carregará para sempre esse estigma. Como se não bastasse, uma pesquisa que fiz recentemente mostrou que a maioria ficou cerca de sete meses só aguardando julgamento — diz Julita Lemgruber.
Já a relação de cidades com mais presos ou apreendidos por tráfico, embora tenha na dianteira a capital e São Gonçalo, chama a atenção pela presença de municípios do interior, como Campos (em terceiro), Cabo Frio (sétimo) e Volta Redonda (nono). Não por acaso, o terceiro bairro com mais detidos, considerando todo o estado, também está longe de grandes centros urbanos: trata-se de São Pedro, na pacata Teresópolis, na Região Serrana.