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8 de mar. de 2022

Governo faz ofensiva para liberar mineração em terra indígena

 Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados

Além de elevar a pressão pela aprovação dos projetos que tratam de combustíveis, a guerra na Ucrânia também está sendo usada pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) e pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), como pretexto para acelerar a votação do projeto que libera mineração em terras indígenas.

Na semana passada, o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), começou a coletar assinaturas para o requerimento de urgência. Lira pretende testar o apoio ao projeto em almoço de líderes da base nesta terça-feira (8), mas não deve ter dificuldade em emplacar a ideia, segundo deputados ouvidos pela reportagem.

Mesmo na oposição, que também deve ser ouvida pelo presidente da Câmara, a avaliação é de que há pouca possibilidade de o texto ser barrado -seriam em torno de 150 votos contrários, e o projeto precisa do apoio apenas da maioria dos presentes no plenário.

O texto é apoiado pela base do presidente Jair Bolsonaro e pela bancada do agronegócio, que argumenta que o maior prejuízo ambiental é a exploração ilegal das reservas, como já ocorreria hoje. Com a guerra na Ucrânia, a possível escassez de fertilizantes se somou às justificativas usadas para votar o projeto.

O texto prevê mudanças radicais em relação ao que se pratica há quase 50 anos no país. A proposta altera o Estatuto do Índio, uma lei vigente desde 1973.

Se o Congresso aprovar o projeto enviado pelo governo da forma como foi elaborado, o Estatuto do Índio deve perder o artigo que restringe aos indígenas a exploração de riquezas em suas terras.

"Garimpagem, faiscação e cata" são atividades exclusivas das comunidades, conforme a lei de 1973. Se a nova lei for aprovada, empresas poderão explorar minérios em terras indígenas.

O projeto do governo Bolsonaro vai além e propõe alterar uma lei de 2007 sobre cultivo de organismos geneticamente modificados. A pesquisa e o cultivo de transgênicos deixariam de ser vedados em terras indígenas, conforme o texto elaborado pelo Executivo e enviado ao Congresso.

Na semana passada, Bolsonaro escreveu nas redes sociais que já em 2016 falava sobre a dependência do potássio da Rússia.

"Com a guerra Rússia/Ucrânia, hoje corremos o risco da falta do potássio ou aumento do seu preço. Nossa segurança alimentar e agronegócio (economia) exigem de nós, Executivo e Legislativo, medidas que nos permitam a não dependência externa de algo que temos em abundância", escreveu.

Desde o início de seu mandato, Bolsonaro defende a possibilidade de mineração em terra indígena. Em abril de 2019, por exemplo, recebeu, em uma transmissão ao vivo, um grupo de indígenas que reivindicava o direito de explorar suas reservas. As associações mais amplas, estruturadas e representativas dos indígenas são contrárias ao projeto.

"O que nós pudermos fazer para que vocês tenham autonomia sobre todo o perímetro geográfico de vocês, nós faremos", disse Bolsonaro na transmissão.

Apresentado pelo governo em fevereiro de 2020, o texto foi enviado por Sergio Moro, então aliado do presidente e ministro da Justiça e Segurança Pública e atual pré-candidato à Presidência, e Bento Albuquerque, que segue no cargo de ministro de Minas e Energia.

Na época, a proposta já enfrentou oposição de ambientalistas e do então presidente da Câmara, Rodrigo Maia (sem partido-RJ), que defendia um debate mais amplo sobre o tema antes de o projeto seguir para plenário.

Agora, sob comando de Lira, o tema deve ser finalmente pautado. Em junho do ano passado, durante discussão de um projeto que muda demarcação de terras indígenas, o presidente da Câmara afirmou que os deputados precisavam ter coragem de debater a exploração em terras indígenas.

"Na terra da deputada Joenia [Wapichana, Rede-RR] o governador me relatava que entre 100 e 200 quilos de ouro saem ilegais dos garimpos de terra indígena. Por dia. E a gente tem que ficar de olho fechado aqui. Isso vai continuar acontecendo", disse, na ocasião.

Um evento marcado para esta quarta-feira (9) tenta pressionar o Congresso contra a aprovação de textos vistos como prejudiciais ao meio ambiente. Cerca de 40 artistas devem se reunir com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para tratar do tema.

O chamado Ato da Terra, que ocorrerá em frente ao Congresso Nacional, foi convocado pelo cantor Caetano Veloso e reúne mais de 230 organizações.

O texto busca regulamentar a mineração em terras indígenas, com base em dois pontos da Constituição Federal.

Um artigo da Constituição afirma que uma lei deve estabelecer as "condições específicas" para pesquisa e lavra de minerais em terras indígenas. Outro diz que o Congresso deve aprovar eventuais projetos de mineração.

Como nunca houve essa regulamentação, a mineração em terras indígenas é vedada na prática. O texto dá ao presidente da República o poder de apresentar ao Congresso projetos de exploração mineral em terras indígenas. Esse encaminhamento pode ser feito inclusive com manifestação contrária de comunidades indígenas afetadas, "desde que motivado".

Estudos técnicos prévios não dependeriam de autorização do Congresso. Haveria uma indenização a indígenas por exploração de energia hidrelétrica, lavra de petróleo e gás e lavra de minerais em terras indígenas. Pagamentos deixariam de ocorrer em casos de estudos prévios.

"Nas áreas em que a ocorrência de minerais garimpáveis for notória, as zonas de garimpagem poderão ser definidas pela ANM [Agência Nacional de Mineração] independentemente de estudo técnico prévio", afirma o projeto de lei.

As atividades minerais poderão ser conduzidas em caráter provisório, enquanto o Congresso delibera sobre pedido de autorização, "exceto se houver determinação do presidente da República em sentido contrário".

O projeto altera ainda a lei que cria o regime de permissão de lavra garimpeira. O texto derruba a vedação de lavras em terras indígenas.

Na avaliação de Juliana de Paula Batista, advogada do ISA (Instituto Socioambiental), é grave a tentativa de votar um projeto que vai regulamentar atividades de impacto em terras indígenas sem uma discussão e análise mais aprofundada sobre o tema e, em especial, sem incluir os indígenas no debate.

"A Constituição estabelece que o Congresso Nacional deve autorizar todo e qualquer empreendimento em terra indígena. O projeto prevê que o Congresso vai fazer essa autorização só nas terras indígenas homologadas, aquelas terras que estão na penúltima fase do processo de demarcação, que é longo."

Para o deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP), o governo quer liberar o garimpo e está usando como pretexto o caso do potássio. "Isso vai trazer mais violência e destruição ambiental para a Amazônia", argumenta.

"Esse assunto é muito delicado e precisava ser debatido com maior transparência", diz o deputado, que coordena a Frente Parlamentar Ambientalista.

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